O Corpo Decide Antes do “Eu”?
O Corpo Decide Antes do “Eu”?
Tema: Neurocorrelatos da Cognição em Tempo Real
Base: Gärtner et al., 2025 – The Readiness Potential Reflects Detailed Prediction of Action Outcome
A ciência está, finalmente, se aproximando daquilo que já intuímos pelo corpo: não é o "eu" que age, mas o corpo que antecipa. O estudo de Gärtner e colaboradores (2025) revela que o chamado Readiness Potential (RP) — um potencial elétrico detectável por EEG antes da ação voluntária — não apenas prepara o movimento, mas também prediz o resultado esperado da ação.
Isso reforça nossos próprios conceitos: a Mente Damasiana, formada pelas dinâmicas da interocepção (sensações viscerais internas) e da propriocepção (posição e movimento corporal), atua como campo primário de pré-consciência, onde o corpo já está decidindo antes do "eu" nomear.
Metabolismo Existencial: Ação Antes da Linguagem
Quando dizemos que alguém “já sabia o que fazer”, muitas vezes estamos descrevendo um estado de Metabolismo Existencial: o corpo, dentro de um contexto simbólico e fisiológico, atua com base em padrões prévios, sensações internas, e referências ambientais, sem passar pela mediação da linguagem ou da identidade narrativa.
Este "agir sem saber que sabe" não é inconsciente no sentido freudiano — é um estado de consciência corporal embutida, que organiza microdecisões segundo memórias sensório-afetivas e padrões anteriores de sobrevivência e pertencimento.
Onde está a Mente? Onde está a Consciência?
Neste ponto, precisamos refinar:
Mente, para nós, é o campo bioelétrico que modula e coordena interocepção e propriocepção em tempo real.
Consciência, por sua vez, é o movimento que se referencia dentro da mente, estruturando-se a partir de uma configuração ativa do corpo: um Eu Tensional.
Mas há duas formas de consciência que devem ser distinguidas:
Consciência Ativada:
Um circuito fechado entre emoção, símbolo e memória afetiva, mantido por reforços simbólicos externos (medo, culpa, desejo, pertencimento).
A Consciência Ativada tende a agir automaticamente, como nos gestos impulsivos diante de redes sociais ou slogans políticos/religiosos.
Consciência Fruída:
Um estado em que o Eu é capaz de habitar o presente corporal, acessando o Apus — uma propriocepção estendida e viva — permitindo ação com metacognição, ética e presença.
O Risco dos Automatismos Sociais
Quando o corpo está imerso em ambientes simbólicos manipulativos — como redes sociais, ciclos religiosos de ativação emocional constante, ou narrativas ideológicas repetidas — o sistema age por antecipação bioelétrica, sem reflexão.
O gesto de curtir, compartilhar ou repetir uma frase não nasce de uma decisão racional, mas de uma sinapse já pronta, com circuito dopaminérgico ativado, reforçado por estímulos prévios.
Ou seja, o Eu não está decidindo — está apenas reproduzindo.
Esse é o mesmo tipo de antecipação que vemos no Readiness Potential, só que capturado por símbolos e algoritmos, não por necessidades reais do corpo.
Conclusão: Restaurar o Tempo Entre o Sentir e o Fazer
Se quisermos restaurar a liberdade de consciência, precisamos reabrir o intervalo entre percepção e ação.
A Mente Damasiana, quando silenciada pela sobrecarga simbólica, não permite que o Eu perceba o Apus, nem reorganize seus Eus Tensionais.
A Consciência Fruída só nasce quando o "eu" pode sentir, avaliar e agir com base no presente — e não em automatismos bioelétricos herdados, ativados ou simulados.
A pergunta, então, não é apenas "quem decide?"
Mas sim: "de onde vem a decisão que estou vivendo agora?"
Se ela não vem do corpo presente, do metabolismo vivo e da relação com o território real, talvez o Eu esteja apenas... ativado.